Curitiba e seu sistema viário
A capital paranaense está chegando ao ponto de degradação acelerada pela necessidade de viabilizar o trânsito no seu centro tradicional. Tendo desprezado todas as lógicas que recomendavam a descentralização e inibição da ocupação do solo central, agora se vê diante da necessidade de criar restrições impopulares, como a proibição de estacionamento em algumas avenidas.
Não aprendemos com as lições criadas pelos nossos pesadelos brasileiros, como podemos ver na cidade de São Paulo e Belo Horizonte. A especulação imobiliária e a visão curta de políticos oportunistas viabilizaram situações absurdas. Engarrafamentos homéricos, inundações diante de qualquer chuva, favelas em locais que deveriam ser preservados, avenidas em fundos de vale, império dos concessionários do transporte coletivo, temos de tudo no nosso Brasil que prefere as fantasias do “esporte” denominado futebol profissional, a folia carnavalesca e os prazeres de praias, onde vale tudo para esquecer o inferno do dia a dia cada vez pior. Isso não é privilégio brasileiro, aqui, contudo, pois somos brasileiros, devemos lutar para maior conscientização e a adoção de soluções melhores.
É mais do que evidente que chegamos ao momento dos viadutos, trincheiras e minhocões como a capital paulista enfrentou nas décadas de sessenta e setenta. Lá gastaram uma fábula de dinheiro em paliativos para descobrir, mais adiante, que o metrô, subterrâneo ou elevado, já vinha tarde. É bom registrar que São Paulo tem condições topográficas semelhantes às de Curitiba, mas usufruía de um sistema viário melhor, ainda que sem planejamento adequado de ocupação do solo urbano. Naquela época os automóveis eram um luxo, possibilitando atrasos no aprimoramento de ruas e avenidas que já não nos podemos permitir.
O planejamento urbano é mais do que necessário; planejamento sério, mais preocupado com os seres humanos do que com impactos ambientais ambíguos e poéticos. Precisamos deixar claro que a prioridade é o ser humano e para tanto a cidade, crescendo, deverá criar espaços e sistemas que a mantenham saudável e segura.
Com certeza o transporte individual a quatro rodas não deve ser nossa prioridade. Nada é mais agressivo ao meio ambiente urbano que o automóvel, para ele boa parte do solo urbano é impermeabilizado e se transforma em ruas e garagens. O carro, que deveria ser uma opção secundária de deslocamento, tornou-se a mais importante, pois não temos calçadas transitáveis, com raras exceções, a travessia de ruas é um perigo, a cidade carece de ciclovias inteligentes e o transporte coletivo urbano precisa de um sistema complementar, elevado ou subterrâneo, que dê à Curitiba condições de trânsito adequadas. Além disso, precisamos criar incentivos, facilidades, meios fiscais e jurídicos para a mobilidade de residência; não tem sentido o cidadão morar num lado da cidade e trabalhar no outro. Deve-se estimular a visão da “não necessidade de transporte”.
Obras urbanas criam emprego.
Menos dinheiro para programas sociais e mais aplicação em infraestrutura talvez seja a lógica que transformará famílias carentes em núcleos produtivos. Ao estado compete implementar programas de criação de pólos de desenvolvimento, talvez até mudando a capital para o centro desse território, cuja área mais central, do ponto de vista geográfico, é carente de meios para um desenvolvimento compatível com o das regiões que a cercam.
Acima de tudo devemos raciocinar com amplitude e isenção de ânimos para que possamos construir uma Curitiba melhor, cidade que foi brindada com diversos estímulos de industrialização, em detrimento de outras regiões paranaenses, configurando uma situação de concentração populacional acelerada. Podemos e devemos lembrar, por exemplo, o programa de erradicação do café, que deu dinheiro aos fazendeiros e ignorou o trabalhador rural; como castigo dessa miopia o estado do Paraná diminuiu de população na década de setenta e a sua capital inchou com pessoas absolutamente despreparadas para viver numa cidade moderna.
As lideranças paranaenses, tão ciosas de seus predicados, podem e devem rever prioridades, do contrário logo estaremos desmanchando quarteirões para que mais automóveis possam trafegar sem engarrafamentos...
Cascaes
25.2.2006
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