quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

A greve dos motoristas de ônibus de Curitiba

Serviços essenciais merecem uma legislação específica para condução de greves. Pode-se, por exemplo, imaginar o que aconteceria com a paralização de concessionárias de energia elétrica. Sem eletricidade nem o serviço de água e esgoto consegue se manter funcionando. Geradores de emergência? Quantos estão em boas condições operacionais e em condições de atender suas cargas? É possível viver no último andar de um prédio de 20 andares sem elevador? Pode-se operar uma concessionária de energia estranha na emergência?
O exemplo citado é para lembrar nossos legisladores de que antes de lidar com questões menos importantes já deveriam ter proposto, discutido e aprovado (com o Poder Executivo) uma lei dedicada às empresas concessionárias essenciais e atividades fundamentais sob administração direta do estado.
E o transporte coletivo urbano? Com certeza é atividade essencial a grandes cidades, onde os trabalhadores se distanciam de seus locais de trabalho à medida que nossas metrópoles incham.
Cidades pequenas têm opções espontâneas. Algumas, como eram as catarinenses Blumenau e Joinville até a década de cinquenta, viam suas ruas cheias de ciclistas nos horários de entrada e saída das fábricas (dezenas de milhares de operários). O Brasil optou por processos de planejamento elitizados, cidades divididas e guetos de toda espécie, agora realmente dependemos de tudo motorizado com duas, três, quatro ou mais rodas.
Temos livros que ilustram as lógicas urbanistas e o comportamento dos chefes das cidades que merecem ser lidos. O livro (Quase-cidadão, 2007) contém análises extremamente valiosas, destacando, pelo que nos afeta (Curitiba) e tem muito a dizer sobre os problemas de hoje o capítulo 13, “Partindo a Cidade Maravilhosa”, escrito por Brodwyn Fischer. Le Corbusier (Urbanismo, 1992) mostra a visão quase romântica dos planejadores do século passado. O livro patrocinado pela EBTU [ (EBTU), (História do Transporte urbano no Brasil, 1984)] demonstra como se pode errar ao se fazer previsões sobre Curitiba (pg. 114, “Sistema de Expresso entra em colapso em 1984). Com mais detalhes sobre nosso povo e suas maiores cidades a coleção (História da Vida Privada no Brasil, 1998) é imperdível.
A greve deste mês de fevereiro de 2012 é mais um episódio que no tempo certo merecerá uma boa análise. Afinal teve a adesão de todos os motoristas, o que é muito raro. Na imprensa vimos reportagens defendendo sistemas de transporte adicionais. As ruas se entupiram de automóveis (cada vez mais baratos e acessíveis a pessoas que antes nem sonhavam com essa hipótese). O Governador falou em subsídios ao transporte coletivo urbano (excelente!). O povo não reage (não é novidade).
Estamos em final de férias, retomando a rotina, a turma ainda terá um feriadão na próxima semana, não seria bom emendar?
Realmente Curitiba precisa desenvolver um sistema complementar de transporte coletivo. Sendo mais caro, exigindo investimentos pesados e tendo um custo operacional maior, terá efeitos nas tarifas e/ou impostos. Não existe milagre. Para que não se desperdice bilhões de reais será prudente escolher criteriosamente trajetos, tecnologia, financiamentos, montar boas equipes de operação etc.
A cidade, contudo, já demonstra o que é viver em grandes metrópoles. Violência, poluição, alongamento de percursos entre trabalho, lazer, residência, escolas, etc. Ou seja, é urgente a necessidade de se estimular fortemente a descentralização do desenvolvimento do Paraná.
E os motoristas? Ganham pouco, muito pouco se lembrarmos a responsabilidade de dirigir seus veículos em canaletas, por exemplo, mão dupla, pista estreita, ônibus articulados e biarticulados, sendo obrigados a cumprir tabelas apertadas e trafegando sobre pistas mal mantidas, invadidas até por skatistas.
Infelizmente quase podemos afirmar que em breve poderemos ter acidentes gravíssimos, se nada acontecer com urgência para maior segurança do trânsito em canaletas e nas ruas comuns.
Vamos insistir, nossos motoristas dirigem carros que por dia transportam centenas ou milhares de passageiros disputando espaços, contra o cronômetro, sem piloto automático, aeromoças para servir um lanche e outras facilidades de pilotos de aviões comerciais.
Diante de tudo isso nada mais lógico do que se viabilizar subsídios (e grandes) para todo tipo de transporte coletivo urbano de passageiros, pagar bem seus profissionais e não se pretender tirar água de pedra, obrigando o sistema a operar em situação de risco elevado (Ônibus atropela uma pessoa a cada 3 dias, 2012).

Cascaes
15.2.2012
Corbusier, L. (1992). Urbanismo. (M. E. Pereira, Trad.) São Paulo: Livraria Martins Fontes Editora Ltda.
EBTU. (s.d.). Fonte: JusBrasil: http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/busca;jsessionid=E014FA19EF99AA9FC888C6C63B68B7AA?q=EMPRESA%20BRASILEIRA%20DE%20TRANSPORTES%20URBANOS%20(EBTU)&s=legislacao
Fernando A. Novais. (1998). História da Vida Privada no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras.
Marès, C. (11 de 2 de 2012). Ônibus atropela uma pessoa a cada 3 dias. Fonte: Gazeta do Povo: http://www.gazetadopovo.com.br/vidaecidadania/conteudo.phtml?tl=1&id=1222504&tit=nibus-atropela-uma-pessoa-a-cada-3-dias
Olívia Maria Gomes da Cunha, Flávio dos Santos Gomes;. (2007). Quase-cidadão. Rio de Janeiro: FGV.
Stiel, W. C. (1984). História do Transporte urbano no Brasil. Brasília: PINI.