sábado, 28 de junho de 2008

Qualidade do transporte coletivo urbano

Um pesadelo brasileiro é observar o desprezo pela qualidade dos sistemas de transporte coletivo urbano. Vamos a extremos, tendo-se em algumas cidades o que existe de melhor em sistemas metroviários e, na outra ponta, ônibus mal cuidados, pessimamente dirigidos, operados da pior maneira possível. Os usuários do transporte coletivo ainda têm o pesadelo de precisar caminhar em calçadas esburacadas, mal feitas, perigosas. Atravessar ruas é um tremendo risco de vida em cidades onde o excesso de velocidade só é inibido em espaços com radares devidamente sinalizados, alertando os infratores de que ali a irresponsabilidade deles será punida.
Com certeza este não deve ser o cenário de Curitiba, mas da grande maioria das nossas cidades.
Por diversas razões, talvez a principal aos eleitos, o fundamental é que o valor da tarifa seja o menor possível. O “vale transporte” criou um custo adicional para todos aqueles que têm empregados. Os empregadores têm automóveis, não usam os nossos ônibus. Reduzindo-se as tarifas, diminui-se o custo representado por esse benefício ao trabalhador.
Em Curitiba a opção pelo transporte individual se reflete na estabilização do número de usuários há muitos anos, apesar do crescimento da cidade. Grandes investimentos no sistema viário da cidade têm estimulado o curitibano a usar seus carros, estímulo reforçado pela insegurança, desconforto, freqüência ruim e tempos de deslocamento crescentes, pois as canaletas pararam no tempo e no espaço, desprezando os recursos mais modernos de ganho de eficiência.
No mundo mais racional o transporte coletivo urbano é subsidiado direta e indiretamente. O fundamental é que tenha qualidade suficiente para atrair o usuário do transporte individual. Procura-se evitar atitudes discricionárias, tendo-se na competição com o automóvel um indicador de qualidade importante.
Naturalmente a cidade precisa decidir o que pretende, mas também deve ser informada de forma completa e eficaz a respeito dos prós e contras de qualquer decisão. É comum em muitos países a decisão ser colocada em plebiscitos onde o contribuinte diz se quer ou não ver o dinheiro dos impostos que paga ser gasto nessa ou naquela área.
A polêmica em torno dos espaços de estacionamento nas avenidas centrais é importantíssima. Não deve ser apenas uma oportunidade de demonstração de autoridade, mas uma situação que deveria ser exposta à audiência pública. Fala-se tanto em impactos ambientais, esse é um caso mais do que justificável de se respeitar todos os procedimentos que se impõem a outros tipos de projetos. Nada mais justo que se exercite a democracia, a participação popular, nessa questão relativa ao congestionamento no centro de Curitiba, até porquê existem alternativas, ainda que, talvez, mais caras.
No caso das avenidas Visconde de Guarapuava e Silva Jardim pode-se discutir com mais detalhes a retirada do canteiro central. Alguns cruzamentos talvez pudessem ser evitados, assim como interferências transversais, onde com facilidade se criam obstruções ao trânsito. Obviamente algumas atividades são incompatíveis com a natureza dessas avenidas, como, por exemplo, acesso a escolas que poderiam oferecer outro lugar para seus alunos. Existe ainda a possibilidade de se estabelecer horários em que o estacionamento seria permitido. Ou seja, há muito a ser discutido. O que não é correto é, intempestivamente, a Prefeitura agir em prejuízo de empreendedores que lá instalaram suas empresas há anos, contribuindo para o crescimento de nossa cidade.
De tudo o que vemos, contudo, podemos concluir que Curitiba está ganhando engarrafamentos pelo abandono do transporte coletivo urbano. Deveríamos ter alternativas, soluções que agradassem a todos aqueles que precisam transitar pela cidade. Micros ônibus, veículos com ar condicionado, lay out mais confortável, mais segurança e capilaridade desviariam muita gente de seus automóveis, ainda mais quando o preço dos combustíveis cresce além da inflação. Paralelamente os taxistas deveriam ter incentivos e oportunidades para redução de suas tarifas. O táxi é um recurso excepcional, de grande valor, por exemplo para as pessoas mais velhas, portadoras de deficiências, freqüentadores de bares e restaurantes etc.
Há muito a ser feito antes de se atingir aqueles que trabalham e precisam de suas empresas para sobreviver.

Cascaes
25.2.2006

"Beer bus" e a bebida ao volante

Prezados senhores

A nova legislação brasileira sobre controle de motoristas (bebidas e direção) é draconiana, devendo afetar os interesses de vocês e os nossos (consumidores).

Gostaria de fazer uma sugestão que talvez já exista em suas análises.

Adiante um artigo (com algumas correções) que escrevi e publiquei em jornal de Curitiba em 2006.
Creio que o tema é atual.
Imagino que uma associação entre fabricantes, seguradoras, sindicatos de bares e hotéis etc. para viabilização de um sistema de “leva e traz” poderia reduzir o custo do transporte especial para freqüentadores de bares e restaurantes, além de se constituir em mídia positiva.
Tenho experiência nessa área pois, como sabem, fui diretor de planejamento do transporte coletivo urbano de Curitiba durante 3 anos (prefeito Roberto Requião) e consultor do prefeito de Blumenau em transporte coletivo urbano (administração Décio Sales).´

Por favor, pensem no assunto e libertem a nossa vontade de tomar umas cervejinhas...

Um grande abraço


Eng. João Carlos Cascaes


Beer bus e a bebida ao volante
Anglicismos são uma ofensa à nossa língua, mas às vezes soam tão bem que fica difícil não adotá-los. “Beer bus” pode ser desagradável a quem sonha com o império de nossa língua mas nunca foi tão oportuno quanto agora pensarmos em algo tão simples quanto um sistema de transporte para pessoas que pretendam aproveitar um final de semana em algum bar ou restaurante. A denominação, o nome fantasia fica ao gosto dos publicitários mas, para mim, “Beer bus” seria um bom nome.
Em relação ao que vamos propor, considerando que a mídia é importante, vale a pena pensar com profundidade o que significa a nossa proposta, pois, acima de tudo, queremos que o trânsito e a vida em nossas cidades sejam mais seguros e que as pessoas se divirtam mais.
Ações policialescas, simplesmente, são antipáticas e em nosso país de tantas injustiças servirão para punir os pobres e criar privilégios para os ricos, sempre apoiados por equipes de advogados. Isso significa que cidades, que pretendam serem justas, amigáveis e ajustadas à realidade social da juventude, principalmente, devem encontrar soluções que compensem as restrições criadas por leis que foram feitas para se evitar os abusos de rotina em nossas noites, com destaque nos finais de semana, quando todos procuram uma forma de se divertir.
Qualquer abuso na bebida cria condições de punição severa se o motorista for flagrado dirigindo algum carro, de acordo com as leis brasileiras.
A lei é assim porque as estatísticas mostram que o álcool é um dos principais responsáveis pelos acidentes em nosso país. Fazendo contas poderemos, facilmente, chegar à conclusão de que centenas de milhares de brasileiros já morreram ou ficaram aleijados graças aos abusos etílicos próprios ou de terceiros ao volante. Quanto sofrimento que poderia ter sido evitado...
A lei é dura e por isso talvez esteja sendo aplicada com miopia pela polícia de trânsito. Em qualquer noite, se quiser, poderá encher as cadeias com pessoas que saem para curtir a balada, como dizem os mais jovens. Lamentavelmente, se a polícia agir como deve, transformará em criminosos registrados em cartório inúmeros brasileiros, pois há muito a ser esclarecido e disciplinado e não será fácil chegarmos ao padrão desejado.
Nossos prefeitos poderiam, diante deste cenário, e a favor da qualidade do trânsito nas cidades, por em concorrência e viabilizar sistemas dedicados a esse tipo de passageiro. Micro-ônibus e táxis poderiam ter incentivos e direito de patrocínio de bares, restaurantes e fabricantes de cerveja e até seguradoras para esse tipo de atendimento. A administração municipal definiria critérios de atendimento em conjunto com os maiores empresários nessa área e, estabelecidas as condições, colocar em disputa os sistemas, permitindo que os interessados adotassem a segurança dos seus clientes como diretriz de negócio.
Note-se que os preços da gasolina e do álcool estão elevados, qualquer estacionamento é caro, em determinadas situações é até difícil encontrar o bar ou restaurante que se procura assim como no retorno para casa o motorista mais irresponsável estará inabilitado, confuso, sem condições mentais e motoras para dirigir.
Veículos com recursos especiais de conforto e segurança, com motoristas bem treinados (inclusive em técnicas de socorro a "bebuns"), poderiam ser a base do sistema que teria, além disso, inúmeras formas de gerenciamento, desde a simples disponibilização dos carros até o rastreamento das pessoas que o utilizarem. Bem dimensionado custaria menos do que se gasta ao se utilizar o transporte pessoal, individual e em internações em hospitais etc...
Outro aspecto importante da existência de um sistema dessa espécie seria tirar de casa pessoas que já se sentem muito velhas para dirigir e que não querem se aventurar com táxis desconhecidos durante a noite. As grandes cervejarias, que tanto gastam em propaganda, teriam mais um espaço de mídia e a certeza de que, agindo dessa forma, estariam contribuindo para a redução do índice de letalidade dos acidentes urbanos.
Cada cidade pode criar sua marca na denominação dos seus atendimentos noturnos a passageiros que desejam beber sem medo do volante. De "carro do pinguço" a simples e prosaicas identificações, como "transporte de passageiros com restrições", as equipes de mídia e de engenharia, arquitetura e urbanismo haverão de descobrir nomes simpáticos que, além disso, sirvam de atração turística para suas comunidades.
Precisamos de metrô, ônibus, táxis e carecemos também de serviços especializados para o transporte de pessoas em condições especiais.
Encontrar uma solução para o desafio que é inibir a direção após bebedeiras é um processo que evitará que muitos acabem nos tribunais, quando não nos hospitais ou nos cemitérios.


Eng. João Carlos Cascaes

Endereço(s) de email(s):
jccascaes@onda.com.br
Rua Dorival Pereira Jorge, 282, Vila Isabel
Curitiba PR 80320-060
Telefone: 32427082

quarta-feira, 25 de junho de 2008

Petrocarros

A descoberta de petróleo nos EUA e a sua transformação em combustível para veículos foi uma das bases da tremenda revolução econômica norte-americana. Mega empresários souberam criar uma base industrial sólida e espaços de dominação tecnológica, que criaram comportamentos típicos daquela super potência. Em paralelo à disseminação dos hábitos de transporte individual, extremamente convenientes à indústria petroleira e automobilística, inibiu-se investimentos no transporte coletivo e as cidades se asfaltaram, concretaram-se e se enfeitaram para os automóveis, o pedestre foi deixado de lado.
Reportagem do Financial Times de Edward Alden, republicada pela UOL em 6 de julho deste ano, oferece alguns dados para reflexão, os norte americanos consomem diariamente quase 21 milhões de barris de petróleo, dois terços no transporte de pessoas e cargas. Lembrando que os EUA correspondem a 5% da população mundial, podemos imaginar como seria a Terra se a humanidade tivesse padrões de consumo semelhantes.
Ou seja, deve ser prioridade absoluta de todas as nações mais desenvolvidas e daquelas com grande potencial de crescimento encontrar formas alternativas de transporte. Nossos ambientalistas precisam, também, agir energicamente contra o padrão norte-americano, que, se adotado universalmente, cobriria a Terra de fumaça em pouco tempo.
Temos a biomassa, ótimo! Bom porque o combustível é renovável e as plantas que o produzem consomem mais CO2 do que a queima de seus produtos libera. Precisamos, contudo, pensar na dimensão dos espaços ocupados pela agricultura e pecuária. Deveremos optar entre alimentos e energia.
O transporte aéreo, (em média 124 Kg de Co2 por hora de vôo por passageiro em avião a jato, o que pode aumentar se o peso médio das pessoas crescer) o mais poluente de todos, deve ser uma exceção.
Temos alternativas. O transporte motorizado, principalmente o individual, é tremendamente agressivo. Para viabilizá-lo boa parte da superfície das cidades é impermeabilizada. Consomem parte substancial do dinheiro do contribuinte. Atropelamentos e acidentes matam milhares de brasileiros ano a ano. Em Curitiba, capital que se diz ecológica, por determinação de regras de construção, sob os prédios são feitas garagens que afundam no solo, afetando drasticamente o lençol freático e a permeabilidade do solo. As ruas usam preferencialmente o asfalto, concreto betuminoso, material totalmente impermeável...
A verdade é que nossos ambientalistas nunca se interessaram em analisar com profundidade o transporte motorizado, preferem discutir a perereca do Tibagi e outras coisas dessa espécie...
Alguns americanos estão preocupados com o consumo de petróleo. As crises no Oriente Médio têm dado um lucro colossal às petroleiras, mas induzem o povo norte-americano a lutar contra povos distantes, onde morrem talvez pelos salários que recebem, cada vez menos por sentimentos patrióticos naturalmente despertados pelos atentados de 11 de setembro. Aos poucos estão percebendo que fazem papel de trouxas para empreiteiras e indústrias de seu país.
O ganho das companhias de petróleo, contudo, é absolutamente extraordinário. Esse dinheiro nas mãos de alguns acionistas é mais um instrumento poderosíssimo de conquista de mentes e corpos. Assim sustentam campanhas eleitorais, a mídia e estimulam a formação de exércitos que seus parceiros nessa lógica mórbida que domina o mundo aplaudem.
Com facilidade podemos jogar a culpa dos problemas ambientais em feras escondidas em escritórios distantes. E nós? O que fazemos para corrigir hábitos tão insalubres?
O transporte coletivo urbano e interurbano precisa ser a opção preferencial de todos nós.. A famosa camada de ozônio e outras camadas podem ser corrigidas se reaprendermos a usar o transporte coletivo e, mesmo nessa condição, optando-se pela forma mais adequada ao uso que se pretender do sistema.

Cascaes
22.7.2006