sábado, 9 de janeiro de 2010

TRANSPORTE BARATO TEM SUBSÍDIO

http://www.setranspetro.com.br/artigos.htm

Criado em outubro de 1995, o Setranspetro, Sindicato das Empresas de Transportes Rodoviários de Petrópolis, é o representante legal de todas as empresas de ônibus que realizam o transporte urbano de passageiros, junto ao poder público, às instituições ligadas ao setor, à imprensa e às lideranças sociais. Assim, o Setranspetro centraliza todas as ações, fatos e questões, sejam elas políticas, técnicas, econômicas ou sociais, que envolvam, direta ou indiretamente, as empresas transportadoras e o Sistema de Transporte Municipal como um todo.


TRANSPORTE BARATO TEM SUBSÍDIO


Sérgio Balloussier



A comparação proposta pelo jornalista Elio Gaspari entre os sistemas de transporte das cidades do Rio de Janeiro, São Paulo e de Nova York abre caminho para um debate extremamente oportuno.



O artigo de Gaspari nos leva a perguntar por que Rio ou São Paulo não conseguem oferecer, a exemplo de Nova York, condições especiais para que seus cidadãos possam ter seus gastos diários com o transporte reduzidos. A resposta não é mencionada, mas é clara. Nos Estados Unidos, como na grande maioria dos países europeus, o transporte coletivo urbano é subsidiado de forma direta ou indireta.



Para se ter uma idéia de como isso ocorre, no ano de 2001, nos Estados Unidos, o subsídio médio ao transporte correspondia a cerca de 50% do seu custo, conforme dados da American Public Transport Association (APTA). O aporte era dividido pelas autoridades locais, estaduais e federal, o que já denota que a preocupação com o transporte extrapola o limite da cidade. A receita operacional cobria a outra metade dos custos, sendo que somente 35% tinham origem na venda de passagens, enquanto cerca de 15% provinham de outras receitas, como a publicidade nos veículos e em pontos de parada e estações de metrô.



Em Paris, onde a diversidade de modalidades também é grande e existem vários bilhetes, com todo tipo de integração intra e intermodal, a receita responde por 30% a 35% do custo operacional, a diferença sendo coberta por subsídios diretos e indiretos, estes últimos garantidos por fonte de custeio definida por um imposto de 2% devido pelos empregadores sob determinadas condições.



A complementação do custo em Estocolmo é garantida pela cobrança de um imposto sobre o salário de toda população ativa, independentemente de ela fazer uso ou não do transporte coletivo. A participação da tarifa varia em torno de 30% dos custos operacionais.



Nas cidades européias, como nas norte-americanas, portanto, o transporte é subsidiado, variando apenas quanto à fonte de custeio a ser adotada. A definição do valor do subsídio é uma decisão política.



E no Rio de Janeiro, por que não há condições de serem aplicados os mesmos critérios? Primeiramente, porque os preços praticados já são inferiores à tarifa calculada. Já chegamos a uma defasagem entre tarifa e preço de cerca de 28%, com médias nunca inferiores a 20%. Nestas condições, poderíamos até chegar ao extremo de afirmar que essa diferença é uma forma de oferecer tarifa social, mas à custa do operador.



Outro fator importante é o das gratuidades, concedidas a idosos (aliás, as únicas previstas na Constituição Federal), estudantes, portadores de deficiência, bem como a outros públicos numericamente menos expressivos. Mais de 25% dos passageiros hoje transportados no Rio de Janeiro se beneficiam de alguma forma de gratuidade, sem qualquer compensação ou subsídio por parte do poder público.



Kombis e vans transportam no Rio, hoje, de 1,5 milhão a 2 milhões de passageiros por dia em completa ilegalidade. O tipo de veículo não atende ao que o Conselho Nacional de Trânsito estabelece para o transporte de passageiros em termos de segurança, bem mais de 50% deles sequer têm registro de bem, a autorização para operar é uma fantasia jurídica, sem falar que o estado e o município não recolhem qualquer imposto. A anarquia é total.



Agora vem o lado perverso de todas estas situações: quem paga por tudo isso? Qual o reflexo para os usuários dos serviços regulares de transporte que não dispõem de benefício algum, tais com gratuidades e vale-transporte?



O vale-transporte é um benefício social, pois a contribuição do trabalhador – ou seja, o que dele pode ser descontado – não pode ultrapassar 6% de seu salário. Para efeito da receita do sistema, o beneficiário de vale-transporte não representa perda. É jogo empatado entre o trabalhador e o operador. No caso das gratuidades, o resultado pende para os que por elas são beneficiados. O operador não recebe nada, pois, como dissemos, não há subsídio.



Já a perda de receita provocada pela operação ilegal das Kombis e vans é total. Se há ganhadores, estes são unicamente os donos destes veículos.



É o poder público que calcula a tarifa e define o preço a ser praticado, mas há que se considerar que a perda de receita não influencia o custo do sistema, já que este é função da variação dos preços dos insumos e da quilometragem produzida. A redução do número de passageiros transportados vem se manifestar no cálculo da tarifa, que é encontrada dividindo-se o custo quilométrico por um índice que expressa o número de passageiros transportados por quilômetro (IPK). Quanto menor o número de passageiros, menor o valor deste índice, pois a quilometragem produzida não varia.



A conclusão que se segue não é difícil: a perda de passageiros leva ao aumento de tarifa e o preço do transporte precisaria ser subsidiado para não acompanhar esta variação. Como não é, a defasagem entre o preço e a tarifa é sempre mantida, em prejuízo dos operadores.



Este é o aspecto perverso de toda a situação: paga mais caro aquele que não tem direito a qualquer benefício, geralmente os que não dispõem de emprego formal.



É por isso que nos países desenvolvidos o poder público subsidia o transporte, buscando fonte de recursos para aplica-los numa das atividades mais importantes da vida moderna, assegurando o inalienável direito de ir-e-vir.





--------------------------------------------------------------------------------



SÉRGIO BALLOUSSIER é engenheiro.



Fonte: O Globo - 04/12/2006

Nenhum comentário: