Ter ou não ter metrô
O processo democrático, a política e a necessidade de se criar fatos positivos diante de eleições, que se repetem indefinidamente, exigem dos seus líderes e torcedores a criação de propostas e atos midiáticos. Isso acontece em qualquer lugar do planeta em que o povo decide, escolhe pelo voto aqueles que já foram premiados com a hipótese de carreira política dentro de associações que denominamos de partidos políticos. A qualidade do ritual e o sucesso das eleições e da própria democracia dependem essencialmente do caráter do povo, de sua cultura e de circunstâncias nem sempre previsíveis.
No Paraná a hipótese de virmos a ter alguns jogos da Copa do Mundo de 2014 criou uma expectativa de viabilização de projetos que a cidade de Curitiba precisa, assim como se transformou em instrumento de valorização de candidaturas ao governo do Estado e outras. Naturalmente todos procuram um lugar nesse palanque que, entretanto, parece cair.
Infelizmente nosso estado costuma aproveitar muito mal suas oportunidades, deixando-se levar facilmente em negociações que poderiam ser favoráveis a um estado que há décadas contribui com montanhas de dólares na pauta “exportações”, que deixa de faturar uma fortuna por efeito de um logro na formulação do ICMS (aliás, ruim para um país que assim passou a premiar o consumo de energia [vide além dessa a CIDE] e valorizar muito pouco a produção), um Paraná que paga um preço elevadíssimo por efeito da péssima proteção contra a entrada de drogas e armas via fronteiras internacionais, um estado que gasta uma fortuna com atividades típicas da União e é sempre colocado entre aqueles que, conforme ouvimos pela milésima vez em uma palestra recente, “receberam” imensos recursos federais (maldita lenda que serve para se criar privilégios a favor de quem não zela pela seriedade de seus governos).
Tudo indica que perderemos o metrô, se não pelas lógicas talvez emocionais colocadas, porque o Governo Federal aos poucos faz a conta do que prometeu. Quem disse que 14 cidades brasileiras teriam os jogos da Copa foi o Presidente da República, passou o filé sob o nariz do povo, agora falta carne.
Talvez o prejuízo se transforme em lucro. Sistemas tão caros quanto um metrô precisam de outros padrões de sustentação mais consistentes do que temos visto em nosso Brasil, sempre refém de políticos nem sempre responsáveis.
Pessoalmente gostaríamos de morar nos melhores lugares, freqüentar os clubes mais completos, ter carro do ano de melhor qualidade, etc.
Podemos pagar?
Vimos o Brasil descendo ladeira abaixo na década de setenta e quebrando para valer no meio dos anos oitenta (1987). Paramos, regredimos, mergulhamos na inflação, desemprego, crise social, uma mistura que só não explodiu em violência política por que, talvez, nosso povo aprendeu a ser estóico, paciente, fatalista, desiludido depois de tantas ações violentas sem resultado ao longo de nossa história.
O sucesso do atual governo diante da crise internacional em curso e as descobertas da Petrobrás, mais ainda, o maravilhoso resultado de uma empresa que poucos brasileiros conhecem, a EMBRAPA, a retomada de grandes obras de energia, transporte e até a reconstrução de nossas Forças Armadas devem incomodar a oposição, mais perigoso, entretanto, é perder o bom senso, o retorno ao clima de irresponsabilidade de três décadas atrás.
E nosso metrô?
Temos méritos, não temos projeto (vide Celso Nascimento, “O metrô curitibano é relativo, suaviza o ministro”, Gazeta do Povo, 8 de novembro de 2009). Que acusação pesada e procedente. O que seria um projeto completo de metrô?
Curitiba precisa de um grande plano de desenvolvimento mostrando seus grandes projetos, prioridades bem discutidas, lógicas consensuais etc. Talvez tudo isso seja uma utopia. Capital inserida num estado com um passivo social colossal, Curitiba tende a ser o ponto de convergência de milhões de paranaenses que descobrem o que significa viver no terceiro milênio, quando a agricultura e a pecuária não precisam de trabalhadores escravos e ignorantes, mas de pilotos de máquinas mais e mais sofisticadas. De qualquer modo, diante de tudo isso, prudência e competência são essenciais a bons governos.
Todos têm seus momentos de inspiração. Grandes líderes assim se fizeram por efeito de decisões geniais, de alguma atitude forte, de algo que marcou suas vidas. Podem decair, regredir, terão tido, contudo, algo que marcou suas vidas e colocou esses cidadãos na história de seu povo. Um exemplo fantástico é a vida e a obra de Leonel Brizola. Da “Coluna Francisco Vinicius Costa Borba” em http://www.comnet.com.br/site/colunistas/vis/?v=1074&col=7 tiramos que
O analfabetismo no RS, na década de 50, era assustador porque faltavam escolas primárias em locais distantes das sedes municipais. Leonel Brizola criou o Sedep (Serviço Descentralizado do Ensino Primário) e começou a construir escolas por todo o território gaúcho (algumas a ainda estão aí, em ruínas, como se fossem marcos fronteiriços entre a escuridão da ignorância e a luz nas trevas), cujo projeto arquitetônico era simples, de madeira, mas elas abrigaram centenas de milhares de novos alunos. Até hoje, a herança Leonel Brizola na educação é impressionante. No seu governo - janeiro de 1959 a janeiro de 1963 -, foram construídas 6.320 escolas, sendo que 5.911 de nível primário, 278 escolas técnicas e 131 ginásios e escolas normais. Com isso, 42.153 professores ganharam contratos e 700 mil alunos tiveram a chance de sentar num banco escolar.
Ou seja, quem precisava de técnicos, como era o caso da COPEL, ia buscá-los no Rio Grande do Sul. Aqui nossos trabalhadores rurais eram simplesmente expulsos das fazendas, emigrando para outros estados ou se acomodando de qualquer jeito em torno de Curitiba e alguma outra cidade mais próxima.
A Região Metropolitana de Curitiba inchou, cresceu e agora se destaca pela violência, entre outros pesadelos.
Quanto podemos e devemos gastar para acolher profissionais da pelota durante uma ou duas semanas? Que cidade nós devemos mostrar aos turistas? O que a União fará para, além do metrô, compensar o Paraná pelas suas disposições federativas passivas e altamente compensatórias (à União) durante todas essas últimas décadas?
E o Metrô?
Dizem que o traçado é ótimo, será?
Temos pesquisas mostrando que essa deveria ser a primeira linha? E o que acontecerá durante a obra? Onde estarão os canteiros? Os moradores e comerciantes serão compensados pelo pesadelo das trincheiras? Por quê substituir o sistema existente pelo metrô? Não seria melhor aproveitar as canaletas para melhor mobilidade? Ou lá devemos fazer jardins paradisíacos? E as tarifas? Subsidiadas?
Realmente é querer demais imaginar que nossos governantes saibam de “estalo” como reagir à notícia “fantástica” de que Curitiba terá jogos da Copa do Mundo. Talvez fosse mais barato simplesmente contratar alguma agência de publicidade de primeira linha para fazer propaganda da cidade...
O problema de Curitiba não é exclusivo, com certeza outras cidade “premiadas” com a Copa do Mundo sintam o mesmo. Pode até acontecer de que após alguns “nãos” orçamentários decidam escolher umas três cidades apenas para realizar a Copa do Mundo com maior dignidade e confiabilidade. Isso com certeza não acontecerá às vésperas das eleições.
O fundamental é termos seriedade, cabeça fria, escolhermos projetos realizáveis com ou sem a Copa do Mundo. Não existe obra mais cara do que aquela que não termina. Antes de colocar a primeira máquina no canteiro de obras deveremos ter certeza da conclusão, do desenvolvimento adequado, para não acontecer aqui o que vimos no Rio de Janeiro, onde, por caprichos políticos, a cidade até hoje não concluiu sua primeira linha de metrô, iniciada há décadas. Lá o sistema foi concebido bem abaixo da superfície, assim os cariocas sabem que existe algo sob os seus pés graças a algumas praças cercadas, aqui, conviver com o eixo “norte-sul” paralisado porque o prefeito e/ou o governador se indispuseram com o Presidente da República será um pesadelo inaudito, muito provável, contudo, diante do nosso histórico político.
João Carlos Cascaes
Curitiba, 8 de novembro de 2009
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