segunda-feira, 4 de junho de 2012

O transporte coletivo urbano – um desafio de todos os cidadãos


O transporte coletivo urbano – um desafio de todos os cidadãos
Há décadas a proposta de reverter a poluição e a necessidade de racionalização das atividades humanas em geral dominam manchetes e criam ONGs de toda espécie. Temas que exigiriam conhecimentos técnicos e científicos de alto nível são conduzidos de forma amadora, pouco eficaz, principalmente nos países mais atrasados.
Ajustes ideológicos e o retorno à escravidão consentida (longe dos olhos) também apareceram com a globalização. Isso tudo, apesar de seus aspectos terríveis, abalou cartéis e corporações, exigindo de todos nós uma análise crítica de padrões, produtos e serviços.
Ressalvas históricas são essenciais à compreensão do cenário atual, precedendo qualquer discussão técnica. O Brasil parou (em muitos sentidos) durante décadas para se refazer da tremenda crise econômica que o levou a uma inflação gigantesca. Os tempos de doença econômica e financeira se somaram ao da cura (Plano Real) com seus ajustes dolorosos.
Com a redemocratização ganhamos uma nova Constituição Federal, distribuindo pessimamente responsabilidades e direitos, ou seja, conseguimos acertar os ponteiros contábeis do Brasil, mas insistimos no centralismo federal de impostos, taxas, encargos, carimbos e burocracia que deixaram as cidades brasileiras em situação de desespero, principalmente onde as questões sociais cresceram desmesuradamente por efeito da migração do campo para os centros urbanos mais atraentes.
Os municípios, com responsabilidades enormes, ficaram com a menor fatia do bolo fiscal e a fobia legiferante de nosso povo criou um cenário de custos elevados, sem atingir a normalidade moral que parecia lastreá-la. Uma racionalização institucional é imperativa se os brasileiros quiserem um estado realmente moderno, justo e sensato.
Alguns indicadores da irracionalidade podem ser levantados e analisados tais como a violência, a poluição, crianças abandonadas, qualidade e amplitude do ensino fundamental e básico etc. mostrando a vida de cidades longe das praias e das delícias do clima tropical em balneários chiques.
O resultado disso tudo é a degradação da vida urbana e opções de existência de cidadãos que se protegem como podem, vivendo entre grades, defendidos quando podem por animais ferozes, guardas, policiamento ostensivo, transitando rapidamente entre ambientes fechados e protegidos.  O pedestre se transformou em pessoa suspeita que, se possível, é mantida longe ou assustada com latidos de cães, arbustos cheios de espinhos, calçadas irregulares, canteiros etc.. Andar pelas cidades é uma aventura de atletas e lutadores bem preparados.
Curitiba é uma cidade que pode demonstrar perfeitamente os efeitos de decisões estratégicas e processos tipicamente brasileiros, ainda que, se comparada com inúmeros centros urbanos seja uma excelente cidade. Essa distinção aumenta sua responsabilidade, pois é considerada modelo de urbanismo.
A reportagem (Sistema de ônibus curitibano perdeu 14 milhões de usuários em 4 anos, 2012) trata de um assunto que foi a marca de honra da capital paranaense, mas que perdeu charme ao longo desses anos em que as tarifas dominaram discussões, sem que as alternativas e os objetivos técnicos e sociais fossem discutidos com profundidade, principalmente por aqueles que poderiam e deveriam mobilizar a sociedade local para essa questão.
O sistema perdeu atratividade como demonstra o infográfico da reportagem dos jornalistas Diego Antonelli e Gisele Barão (DIEGO ANTONELLI, 2012). Isso tem razões de sobra para acontecer em Curitiba.
Não é fácil optar pelo transporte coletivo quando chegar (ou voltar) e permanecer num ponto de ônibus são situações que significam exposição a acidentes, agressões (inclusive de cães bravios), assaltos, quedas, tropeços, atropelamentos, chuva, frio, etc. e quando os automóveis são cada vez melhores, mais baratos, confortáveis e seguros, existindo para seus usuários uma quantidade enorme de estacionamentos (alguns deles impermeabilizando áreas enormes de solo (agravando o risco de enxurradas e enchentes locais)).
A opção pelo automóvel fica flagrante quando percebemos que o calçadão da Rua das Flores parou por aí. A cidade deixou de criar ruas para pedestres até em circuitos óbvios, como a ligação entre os grandes terminais e praças do centro da cidade e em alguns bairros (Santa Felicidade, por exemplo). Usar o transporte coletivo urbano, mais ainda com a obrigação de motoristas de cumprirem tabelas quase impossíveis, tornou-se um caso de ousadia para quem tem opções...
Estamos vendo sinais positivos, contudo.
As calçadas estão mudando [ (Cidade do Pedestre), (Cidadania de Pé no Chão)] ufa! As leis, decretos e normas técnicas a favor das pessoas com deficiência (Cascaes, Direitos das Pessoas com Deficiência) fortalecem a qualidade da vida de todos e Curitiba tem uma (Secretaria Especial dos Direitos daPessoa com Deficiência) que mostra resultados nas mudanças que a PMC promove. Ótimo, parabéns ao Secretário Irajá de Brito Vaz.
A reportagem citada (DIEGO ANTONELLI, 2012) traz boas notícias da URBS, que não resgatam, contudo, as decisões técnicas do edital de outorga de concessões para o transporte coletivo, momento em que desprezaram conquistas importantíssimas e outras abandonadas, como, por exemplo, a criação da frota pública (uma maneira inteligente de subsidiar o sistema), o pagamento por quilômetro rodado, a eliminação de áreas físicas de concessão, licitar permissões e não concessões, a multiplicação de permissionárias etc. Com a assinatura dos contratos de concessão para exploração do transporte coletivo urbano de Curitiba perdemos a oportunidade de aprofundar a análise dos aspectos positivos da desregulamentação [(DEREGULATING URBAN TRANSPORTATION), (Deregulation of local bus services in Great Britain: an introductory review)] além de outras formas de contratação de serviços.
Entre as muitas notícias contidas na reportagem citada e base deste artigo a mais importante, contudo, é a operação efetiva da frota: “Araújo ainda destaca a Central de Controle Operacional (CCO), que começou a funcionar no mês passado e visa a monitorar o trânsito. Em casos de congestionamento e acidentes, por exemplo, os motoristas serão avisados em tempo real, por painéis, sobre as condições do tráfego. “Até o próximo ano, devemos ter todas as informações sobre rotas disponíveis para o usuário”.” Os sistemas de monitoramento e controle ganharam potencial ilimitado com a redução de custos e aumento substancial do potencial tecnológico de sensores, transmissão de sinais, digitalização, processamento de dados, eletrônica embarcada e muito mais que só bons engenheiros entendem e podem fazer.
Precisamos, contudo, pensar em mais recursos para as cidades, dinheiro dedicado ao aprimoramento da vida urbana. Em relação ao transporte coletivo vale um estudo minucioso da lógica francesa, onde a decisão sobre a implantação de sistemas é da população das comunas, que se associam como julgarem melhor em função de discussões intensas e responsáveis, culminando com a opção por uma taxa fiscal [ (Versement transport), (Réglementation versement transport, 2008)] e participação da República Francesa, sempre atenta aos interesses industriais da nação.
E as pesquisas?
O ponto de partida de decisão precisa ser conhecer a vontade e mobilidade do povo. Temos pesquisas de origem e destino? Sabemos por que (dados e fatos) o povo curitibano foge do transporte coletivo urbano exceto em horários mais seguros e tranquilos? Aqui existe até um (Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba) que deveria dar essas respostas anualmente, se possível, pois a cidade é dinâmica e uma nova grande indústria, shopping, prédio ou universidade pode alterar substancialmente o trânsito nessa ou naquela região da cidade. Não praticamos estudos de impacto ambiental urbano, logo dependemos muito do Governo Municipal para avaliações que deveriam preceder certas mudanças na cidade.
Táxis?
Se existe um fenômeno em Curitiba é o desaparecimento dos táxis em horários que não lhes convêm (taxistas). Lamentavelmente mais uma vez a PMC decide de forma equivocada ao transformar em concessão eterna (Licença de táxis e inconstitucionalidades, 2012) o direito de explorar esse serviço essencial, que pode e deve ser considerado no conjunto “transporte coletivo”, pois se não levam por viagem dezenas a centenas de pessoas, multiplicam a capacidade do transporte individual em viagens sucessivas sem a ocupação de espaços urbanos de forma agressiva, como é o caso do transporte individual (garagem/estacionamentos urbanos). Mais ainda, a exemplo de cidades mais desenvolvidas poderia existir um padrão Curitiba (lembrando Londres) para os veículos, criando mais segurança e eficácia para motoristas e passageiros. Centrais de teletáxi? Polícia Militar e URBS deveriam criar uma central em parceria, unindo segurança e bom atendimento, reduzindo os custos de inserção nas existentes por competição necessária (cartel?).
Concessões ou permissões [ ( Concessões e Permissões de Serviços Públicos), (Sobre a concessão e permissão de serviços públicos)]?
Concessões têm lógica em serviços que exigem grandes investimentos irremovíveis como é o caso da energia elétrica, saneamento básico, tratamento de lixo, aeroportos, portos e coisas dessa dimensão e construção. Não é o caso do transporte coletivo e serviços de táxi que podem existir sem a proteção de contratos de concessão. O fundamental é a existência de vigilância como talvez tenhamos na evolução do CCO (DIEGO ANTONELLI, 2012) e um relacionamento honesto entre empresários e governo (é possível?). Obviamente o empresário, duvidando da seriedade do governo, prefere ser contratado na modalidade “concessão”. De qualquer modo os serviços “ônibus” e “táxis” podem ter inúmeros empresários contratados graças aos mais modernos sistemas de gerenciamento remoto.
Urbanismo?
No mundo inteiro podemos ver e estudar soluções até sem sair de casa, graças à internet que bem usada oferece informações valiosas que procuramos assimilar e colocar em blogs [ (Cascaes, Reurbanização Inclusiva), (Cascaes, Ponderações Engenheirais), (Cascaes, Engenharia - Economia - Educação e Brasil) etc.]. O fundamental é sempre lembrar que não existe panaceia, que qualquer lugar habitado desse planeta possui características próprias e nós temos nossos próprios desafios e limitações.
Essa singularidade exige discussões, análises e autocríticas permanentes de todos nós, estejamos no Governo ou não, afinal, por quê não participar? Somos todos responsáveis pelo nosso futuro, pelo menos na fração correspondente aos votos que damos nas eleições para escolha de governantes e representantes nos diversos níveis políticos.
Cascaes
2.6.2012
Concessões e Permissões de Serviços Públicos. (s.d.). Fonte: webjur: http://www.webjur.com.br/doutrina/Direito_Administrativo/Concess_o_e_Permiss_o.htm
Cascaes, J. C. (s.d.). Fonte: Cidade do Pedestre: http://cidadedopedestre.blogspot.com.br/
Cascaes, J. C. (s.d.). Fonte: Ponderações Engenheirais: http://pensando-na-engenharia.blogspot.com/
Cascaes, J. C. (s.d.). Fonte: Reurbanização Inclusiva: http://reurbanizacao-inclusiva.blogspot.com.br/
Cascaes, J. C. (s.d.). Fonte: Engenharia - Economia - Educação e Brasil: http://economia-engenharia-e-brasil.blogspot.com.br/
Cascaes, J. C. (s.d.). Fonte: Direitos das Pessoas com Deficiência: http://direitodaspessoasdeficientes.blogspot.com.br/
Cervero, R. (s.d.). DEREGULATING URBAN TRANSPORTATION. Fonte: http://www.cato.org/pubs/journal/cj5n1/cj5n1-12.pdf
Cidadania de Pé no Chão. (s.d.). Acesso em 30 de 4 de 2012, disponível em Cidade do Pedestre: http://cidadedopedestre.blogspot.com.br/2010/01/cidadania-de-pe-no-chao.html
DIEGO ANTONELLI, G. B. (2 de 6 de 2012). Sistema de ônibus curitibano perdeu 14 milhões de usuários em 4 anos. Fonte: Gazeta do Povo: http://www.gazetadopovo.com.br/vidaecidadania/conteudo.phtml?tl=1&id=1261341&tit=Sistema-de-onibus-curitibano-perdeu-14-milhoes-de-usuarios-em-4-anos
Félix, R. (2 de 6 de 2012). Licença de táxis e inconstitucionalidades. Fonte: Gazeta do Povo: http://www.gazetadopovo.com.br/colunistas/conteudo.phtml?tl=1&id=1261371&tit=Licenca-de-taxis-e-inconstitucionalidades
Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba. (s.d.). Fonte: IPPUC: http://ippucweb.ippuc.org.br/ippucweb/sasi/home/default.php
Junior, A. F. (s.d.). Sobre a concessão e permissão de serviços públicos. Acesso em 3 de 1 de 2012, disponível em DireitoNet: http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/2658/Sobre-a-concessao-e-permissao-de-servicos-publicos
RICORDEAU, P. (2008). Réglementation versement transport. Fonte: Urssaf: http://www.urssaf.fr/images/ref_lc2008-002.pdf
Secretaria Especial dos Direitos daPessoa com Deficiência. (s.d.). Fonte: Portal da Prefeitura de Curitiba: http://www.curitiba.pr.gov.br/conteudo/equipe-sedpd-secretaria-especial-dos-direitos-da-pessoa-com-deficiencia/7
White, P. (s.d.). Deregulation of local bus services in Great Britain: an introductory review. Fonte: Taylor & Francis Group content: http://www.tandfonline.com/doi/abs/10.1080/01441649508716910
Wikipédia, e. (s.d.). Versement transport. Acesso em 28 de 4 de 2012, disponível em Wikipédia: http://fr.wikipedia.org/wiki/Versement_transport

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